quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

UMA FELICIDADE VIÁVEL


Muito se fala de felicidade. É prometida como o desfrute final de todas as religiões para àqueles que nelas crêem e garantida por toda a propaganda nas emissoras de rádio, canais de televisões, vendedores e outdoors em todas as línguas por todo o mundo. Tanto mais se fala dela quanto mais distante nos parece. Sentimento, sensação ou experiência que permeia todos os sonhos humanos, é ao mesmo tempo tangível e inacessível. Refutamos as experiências que nos afastam dela e procuramos, quase obsessivamente, reprisar aquelas que nos proporcionaram alguns instantes desta impressão inesquecível, transcendental e, no entanto, excessivamente volátil.

Afinal o que é a felicidade? Iniciemos pelo que nos diz o Dicionário Houaiss: qualidade ou estado de feliz; estado de uma consciência plenamente satisfeita; satisfação, contentamento, bem-estar. Gosto dela. Aproxima-se bastante daquilo que desfrutamos. Porém, como existem muitos significados para o termo, ouso colocar aqui a minha colher e sugerir que definamos felicidade como o estado neurofisiológico desencadeado pelo psiquismo quando identificamos que nada nos falta, que estamos momentaneamente completos.

Uma curiosidade: muitas das vezes em que somos possuídos por esta felicidade, é tal a sensação de satisfação, de preenchimento em si mesmo, de auto-suficiência que a possibilidade de morrermos naqueles instantes não nos assusta. Fica a impressão de que o medo do fim da vida é proporcional ao quanto não conseguimos transformar nossos sonhos mais profundos em realidade, na maneira como deixamos nossa marca no mundo e nas pessoas que amamos.

No entanto, me parece que a felicidade está mais presente em nossas vidas do que alcançamos apreender. Suspeito que o principal motivo é o modelo estereotipado hollywoodiano que absorvemos desde crianças. Quando nossas experiências cotidianas de felicidade nos surgem, não se assemelham ao padrão introjetado na memória inconsciente e aí ficamos impossibilitados de identificá-las.

De qualquer maneira, os momentos de felicidade são definitivamente finitos. Ou seja, não duram para sempre. São permeados por outras situações que incluem diferentes coeficientes de insensibilidade, sofrimento, alegria, euforia e outras tantas sensações com que convivemos desde o nascimento até a última respiração.

Portanto, poderíamos dizer que uma pessoa é tanto mais feliz quanto a sua habilidade em realizar escolhas inteligentes que lhe desencadeiem em uma quantidade diária maior destes estados neurofisiológicos de plenitude.

E quais seriam essas escolhas superlativas? A seguir relaciono algumas segundo os pontos de vista deste autor, e que em nenhum momento ousariam e pretenderiam representar a verdade sobre a felicidade. São apenas pontos de partida, meras sugestões para uma felicidade mais possível, humana e viável. Poderíamos dizer que uma felicidade com tendência ao concreto.

1. um corpo saudável , pois afinal sem um corpo, a experiência existencial não é possível e se ele não for saudável, esta será a maioria do tempo desagradável e sofrida. Até conhecem-se pessoas que conseguem ser muito felizes apesar de grandes sofrimentos físicos, mas é exceção à regra. Corpos saudáveis liberam uma quantidade enorme de serotonina e outros neurotransmissores, gerando muita felicidade bioquímica;

2. estabilidade econômica , que se constitui naquilo que o DeRose definiu muito sabiamente como riqueza: ter-se mais do que se precisa . Para alguns, esta riqueza significa uma pequena casa, um emprego e um cachorro. Para outros, o iate Laura , do rei Roberto Carlos ainda não seria o suficiente. Não importam os valores, pois são diferentes para cada ser humano. O importante é que se consiga encontrá-los;

3. faça shirshásana diariamente. Constitui-se em inverter a posição do corpo, apoiando o alto da cabeça no chão e colocando os pés e as pernas para cima, de maneira a irrigar concentradamente o encéfalo, popularmente conhecido por cérebro. Além de prevenir síndromes como a de Parkinson e Alzhaimer, estimula a quantidade de sinapses nervosas simultâneas, promovendo a criatividade, intuição e inovação; além de irrigar os lóbulos corticais, principalmente o esquerdo. Pessoas que o instigam, são pessoas que solucionam mais rapidamente os problemas cotidianos, refazendo rapidamente a homeostase psico-orgânica, ou seja, felicidade instantânea.

4. cultive o hábito de fazer escolhas responsáveis. Uma pesquisa foi realizada com um grupo de anciões com mais de oitenta anos num asilo. Foram divididos em dois grupos-experimentos de dez indivíduos, aos quais eram cedidos diariamente filmes, dieta e atividades de lazer variados. A diferença era que um dos grupos podia optar enquanto o outro tinha que aceitar as sugestões impostas pelos pesquisadores. No final de algum tempo o índice de doenças e mortes era significativamente menor entre aqueles que podiam eleger. Escolher estimula a percepção da liberdade individual e esta aumenta o prazer de viver fortalecendo os mecanismos de preservação biológica.

5. viva uma vida sexual plena , seja o que isto signifique para você. O mundo é cada dia mais pansexual. O leque de opções sexo-comportamentais é muito grande: heterossexual, homo ou bissexual. E ainda pode se combinar com um, dois ou muitos parceiros. Ou até nenhum! Observe-se depois de um relacionamento sexual mutuamente satisfatório. A sensação é de plenitude. De satisfação plena. Ou seja: felicidade! É o justo prêmio que a natureza lhe proporciona por estar preenchendo os desígnios biológicos para os quais foi criado. O que não ajuda a ser mais feliz é reprimir o instinto sexual. Porem, educá-lo e refina-lo sim. É possível e desejável, de maneira a acordar em nós outras sensações ligadas a uma sexualidade plena, de que todo ser humano tem direito. E, não obstante a História humana ser eivada de autênticos santos que atingiram um estado particular de felicidade através de transes místicos e que para atingi-los abriram mão da sexualidade, seres humanos normais não nascem com esta predisposição e, assim sendo sofreriam muito se adotassem o celibato;

6. estabilidade relacional, que para alguns é encontrada num casamento monogâmico. Para outros somente se compreender mais de um parceiro fixo. E ainda alguns que atingem a estabilidade com muitos parceiros. E vamos incluir também os celibatários nesta lista que parece não ter fim. Mais uma vez, cada um deve procurar um modelo que lhe satisfaça plenamente. E se precisar, experimentar até descobri qual é o seu padrão. E lembre-se que este inventário de vínculos abarca também amigos verdadeiros, confiáveis e cúmplices. Hoje se sabe que casamentos estáveis são aqueles nos quais os cônjuges também são grandes amigos. O que realmente importa é se construir uma rede de relações duradouras e onde se possa encontrar ressonância para repartir os bons e maus momentos, ou seja, a curta e fascinante aventura que é viver;

7. vida com significância , no sentido de identificar o seu valor e aplicá-lo no mundo através de uma atuação social que tenha importância, que faça alguma diferença, modificando e melhorando o mundo e a espécie pela nossa atuação particular. Curiosamente, independe da profissão. Afinal, qualquer atividade laboral, seja qual ela qual for, é importante. O que estamos falando é do coeficiente de conexões que o indivíduo consegue identificar entre a sua performance laboral e a realidade que o cerca. Quanto mais acoplamentos, interconectividades simultâneas o indivíduo conseguir perceber, mais significância e felicidade genuína extrairá do seu trabalho.

Vislumbre-se incorporando estas cinco escolhas comportamentais. Você concorda comigo que a vida fica mais fácil e prazerosa? E refletindo bem, é só começar. Objetivamente, nada nem ninguém sabota nossos desejos. Errando e acertando, em algum momento, inevitavelmente, nos aproximaremos destes padrões ou outros que cada um definirá como prioritários. A felicidade não tem uma fórmula única. Porém, devemos e podemos procurar a nossa maneira de encontrá-la. Conscientes da sua volatilidade e inconstância, porém também da nossa meritocracia em desfrutá-la pelo maior tempo e quantidade de vezes possível. E que, definitivamente só depende de nossas escolhas.

Joris Marengo

Florianópolis
joris.marengo@uni-yoga.org.br

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